Maria João Real Dias, representante do Instituto da Vinha e do Vinho (IVV), apresentou durante o Fórum Anual 2024 uma análise sobre a situação da exportação do vinho português e a conjuntura global do mercado vinícola.
Foi particularmente interessante perceber as mudanças no ranking dos maiores produtores e exportadores de vinho no mundo. Como de costume, iremos destacar os slides mais relevantes e partilhar as nossas opiniões.
Principais Países Produtores de Vinho: Quantidade e Valor
Quando analisamos a produção de vinho por quantidade, Portugal ocupa o oitavo lugar, com 319,3 milhões de litros de vinho exportados em 2023. No que diz respeito ao valor das exportações no mesmo ano, Portugal aparece na nona posição.
Já em termos do preço médio por litro de vinho exportado, observa-se que os vinhos portugueses não atingem os preços elevados dos franceses, mas também não são tão baratos quanto os espanhóis.
Em 2023, o preço médio de 1 litro de vinho português exportado foi de 2,9 euros.
País | Volume (milhões de litros) | Valor (milhões de euros) | Preço Médio por Litro (€) | % em Relação a Portugal |
França | 1285 | 11967 | 9,31 | 321,17 |
Nova Zelândia | 270 | 1195 | 4,43 | 152,63 |
Itália | 2137 | 7770 | 3,64 | 125,39 |
Alemanha | 327 | 1133 | 3,46 | 119,49 |
África do Sul | 349 | 1060 | 3,04 | 104,74 |
Portugal | 319 | 925 | 2,9 | 100 |
Chile | 683 | 1412 | 2,07 | 71,3 |
Austrália | 640 | 1287 | 2,01 | 69,35 |
No slide seguinte, é apresentada a dinâmica da evolução dos preços e do valor das exportações de vinhos portugueses ao longo dos últimos 13 anos.
Através da linha vermelha que representa o preço por litro de vinho, é possível observar um crescimento constante ao longo do período analisado, com um pico atingido em 2022.
Este aumento reflete uma valorização progressiva dos vinhos portugueses no mercado internacional, associada a uma melhoria da perceção de qualidade e ao fortalecimento das marcas portuguesas em mercados estratégicos.
A tendência de valorização demonstra o sucesso das estratégias de exportação e promoção, mas também evidencia o desafio de manter esta trajetória de crescimento num mercado cada vez mais competitivo.
Outra observação importante é que, apesar da pandemia de Covid-19 e das restrições associadas, o volume de exportações de vinho português em 2020 manteve-se estável.
No entanto, no que diz respeito ao valor das exportações, houve uma queda de 6,14% em comparação com o ano anterior.
Essa queda no valor pode estar relacionada à pressão sobre os preços, mudanças na demanda global e aos desafios logísticos impostos pela pandemia. Ainda assim, a resiliência do setor permitiu a manutenção de volumes significativos, demonstrando a força dos vinhos portugueses no mercado internacional.
Esses dados mostram a importância de investir em campanhas de promoção e fortalecer relações comerciais nesses mercados para consolidar e expandir a presença do vinho português a nível global.
A França é destacadamente o maior consumidor de vinhos portugueses, tanto em termos de quantidade como de valor total das exportações. No entanto, mercados como os Estados Unidos e o Reino Unido mostram uma preferência por vinhos de maior valor unitário, enquanto o Brasil adquire vinhos portugueses a preços médios mais baixos, refletindo diferenças nos perfis de consumo e no posicionamento dos vinhos em cada mercado.
O Mercado dos EUA: Um Alvo desejado
Os Estados Unidos são um dos mercados mais cobiçados para exportadores de bens de consumo e produtos alimentares, incluindo vinhos. A atratividade do mercado norte-americano deve-se à sua dimensão, poder de compra e apreciação crescente por vinhos importados de qualidade.
Embora Portugal tenha mantido a 8.ª posição no mercado dos Estados Unidos em 2022 e 2023 em termos de valor das exportações de vinho, a diversidade e a qualidade dos vinhos exportados ajudam a consolidar esta posição.
Vinhos Tranquilos com DO/IG
Volume:
Diminuição ligeira de 18,6 milhões de litros (2021) para 17,1 milhões (2023), marcando uma queda total de 8,1% ao longo do período.
Valor:
Aumentou de 52,5 milhões de euros (2021) para 53,9 milhões (2023), indicando uma pequena valorização.
Vinhos Tranquilos Sem DO/IG
Volume:
Queda significativa de 4,3 milhões de litros (2021) para 2,7 milhões (2023), uma redução de 37,2%.
Valor:
Reduziu-se de 9,3 milhões de euros (2021 e 2022) para 7,9 milhões (2023), refletindo a menor procura ou preço médio inferior.
Vinho do Porto
Volume:
Diminuição contínua de 4,2 milhões de litros (2021) para 3,1 milhões (2023), representando uma queda de 26,2% no período.
Valor:
Redução de 38,7 milhões de euros (2021) para 33,5 milhões (2023), com uma queda de 13,4%, possivelmente devido à diminuição no consumo.
Vinhos Espumantes e Espumosos
Volume:
Estável ao longo dos três anos, com 0,2 milhões de litros exportados em todos os períodos.
Valor:
Pequena variação positiva, de 0,9 milhões de euros (2021) para 1,1 milhões (2023).
O volume total exportado para os EUA sofreu uma queda gradual ao longo dos três anos, afetando principalmente os segmentos de Vinhos Tranquilos Sem DO/IG e Vinho do Porto.
O valor total manteve-se relativamente estável para os vinhos com DO/IG e espumantes, mas os segmentos mais afetados foram novamente os Vinhos Tranquilos Sem DO/IG e Vinho do Porto.
A valorização de vinhos tranquilos com DO/IG sugere uma mudança para produtos de maior qualidade ou valor agregado no mercado norte-americano.
Agora vamos analisar a informação sobre a exportação de vinhos portugueses em 2024, de janeiro a setembro.
É evidente que os resultados deste ano mostram crescimento tanto em volume (+7,9% em relação a 2023) quanto em valor (+2,5% em relação a 2023).
O maior aumento em volume foi registado na União Europeia, com um crescimento de +13,3% em relação a 2023.
No entanto, o valor das exportações de vinhos para a União Europeia em 2024 aumentou de forma mais moderada, apenas +4,5% em relação a 2023
Se analisarmos o preço por litro de vinho exportado, observa-se uma tendência de queda no valor, o que não é um sinal positivo.
Isso é preocupante, pois não seria desejável que os vinhos portugueses de qualidade fossem percecionados globalmente como vinhos baratos.
Europa Comunitária:
2023: 2,76 €/litro (+0,36% em relação a 2022).
2024: 2,55 €/litro (-7,6% em relação a 2023).
Países Terceiros:
2023: 2,88 €/litro (+0,7% em relação a 2022).
2024: 2,80 €/litro (-2,8% em relação a 2023).
Total:
2023: 2,82 €/litro (+0,36% em relação a 2022).
2024: 2,69 €/litro (-4,6% em relação a 2023).
Uma leve valorização em 2023 foi seguida por uma queda acentuada em 2024.
Agora vamos analisar as exportações em 2024 por tipo de vinhos.
Aqui temos uma situação interessante: observa-se uma tendência de queda nas vendas de Vinho do Porto, tanto em quantidade como em valor.
Por outro lado, os vinhos tranquilos portugueses mostram um crescimento, com destaque para o forte aumento dos vinhos certificados.
Vinhos com DO/IG (Denominação de Origem/Indicação Geográfica)
Volume:
2023: 111 milhões de litros (+2,8% em relação a 2022)
2024: 120 milhões de litros (+8,1% em relação a 2023)
Valor:
2023: 329 milhões de euros (+4,1% em relação a 2022)
2024: 347 milhões de euros (+5,5% em relação a 2023)
Crescimento constante tanto em volume como em valor, demonstrando uma procura contínua por vinhos de maior qualidade.
Vinhos sem DO/IG
Volume:
2023: 86 milhões de litros (+1,2% em relação a 2022)
2024: 96 milhões de litros (+11,6% em relação a 2023)
Valor:
2023: 114 milhões de euros (estável em relação a 2022)
2024: 121 milhões de euros (+6,1% em relação a 2023)
Apesar do aumento de volume, o crescimento em valor é mais moderado, indicando que estes vinhos podem ter um preço médio mais baixo.
Vinho do Porto
Volume:
2023: 39 milhões de litros (-2,5% em relação a 2022)
2024: 37 milhões de litros (-5,1% em relação a 2023)
Valor:
2023: 212 milhões de euros (-1,9% em relação a 2022)
2024: 203 milhões de euros (-4,2% em relação a 2023)
Queda contínua tanto em volume quanto em valor, sugerindo uma diminuição da procura ou possível desvalorização no mercado internacional.
Vinhos Espumantes e Espumosos
Valor:
2022: 8 milhões de euros
2023: 7 milhões de euros (-12,5% em relação a 2022)
2024: 7 milhões de euros (estável em relação a 2023)
Estagnação em volume e diminuição de valor, indicando que este segmento enfrenta desafios no mercado.
Outro slide, que a nosso ver ajuda a explicar a queda nas vendas de Vinho do Porto, apresenta informações sobre as exportações por país.
É importante notar a redução das vendas no Reino Unido, que é um mercado tradicional para o Vinho do Porto.
Aqui há espaço para análise: por que ocorreu uma queda tão significativa nas vendas, que não foi compensada pelo aumento em outros mercados? Além disso, no mercado dos EUA, o Vinho do Porto também não apresenta crescimento.
Também é visível a tendência de crescimento das exportações de vinhos portugueses para o Brasil, com um aumento de 13,9% tanto em quantidade quanto em valor.
Seria ideal focar na exportação de vinhos que não sejam os mais baratos, de forma a consolidar na mente dos consumidores a associação de que o vinho português é qualitativo e de valor elevado.
A transição para um segmento mais caro permitirá gerar os recursos necessários para o desenvolvimento sustentável do setor vinícola em Portugal.
Conclusão
A análise das exportações de vinhos portugueses em 2024 revela uma dinâmica de mercado com desafios e oportunidades. Por um lado, observa-se um crescimento consistente no mercado brasileiro, demonstrando o potencial de expansão em países emergentes.
Por outro, a queda nas vendas de Vinho do Porto, especialmente em mercados tradicionais como o Reino Unido e os Estados Unidos, evidencia a necessidade de reavaliar estratégias de promoção e diversificação.
A transição para segmentos de maior valor, especialmente com o crescimento dos vinhos tranquilos certificados, surge como um caminho estratégico.
Este posicionamento poderá consolidar a imagem do vinho português como sinónimo de qualidade, ao mesmo tempo que gera recursos para o desenvolvimento sustentável do setor.
Focar na valorização e no fortalecimento da perceção de qualidade dos vinhos portugueses será essencial para garantir a sua competitividade no cenário internacional.