A vindima de 2024 revelou-se um momento marcante para o setor vitivinícola português, evidenciando transformações estruturais que exigem atenção e reflexão estratégica. Num contexto global desafiante, produtores, comerciantes e exportadores enfrentaram dificuldades na comercialização das uvas, o que gerou preocupações legítimas quanto à sustentabilidade económica da atividade.
Face a este cenário, a ANCEVE – Associação Nacional dos Comerciantes e Exportadores de Vinhos e Bebidas Espirituosas – propôs uma reunião com a Comissão Parlamentar de Agricultura e Pescas com carácter de urgência. O objetivo é promover um debate construtivo sobre o futuro próximo da fileira vitivinícola, com foco nas colheitas de 2025 e nas medidas que poderão reforçar a resiliência do setor.
Sinais de Pressão Comercial
Durante a vindima de 2024, diversos viticultores enfrentaram limitações na venda das suas uvas. Algumas operações de compra foram reduzidas ou canceladas, refletindo as pressões do mercado internacional e as dificuldades sentidas por vários operadores económicos. Esta situação levou a que parte da produção não fosse escoada, algo que, embora não inédito, merece uma análise cuidada sobre os mecanismos de articulação entre produção e comércio.
Ao mesmo tempo, verificou-se uma maior prudência por parte de alguns compradores tradicionais, que comunicaram a sua indisponibilidade para adquirir uvas em 2025. Este sinal alerta para a necessidade de antecipar soluções e reforçar canais de cooperação entre os diferentes agentes do setor.
Necessidade de Liderança Institucional
A conjuntura atual coincidiu com uma fase de indefinição no Instituto da Vinha e do Vinho (IVV), entidade central na regulação e apoio ao setor. A exoneração verbal do seu Conselho Diretivo, ocorrida em janeiro de 2025 e ainda não formalmente concluída, gerou dúvidas e expectativas nos intervenientes do setor. A ausência de clareza e de nomeações subsequentes cria um vazio que dificulta o planeamento e a execução de políticas públicas eficazes.
A ANCEVE defende que qualquer transição de liderança deve ser acompanhada de diálogo com os representantes do setor, garantindo continuidade institucional e apoio técnico num momento particularmente exigente.
Contexto Internacional em Mudança
O início de 2025 trouxe consigo vários desafios à escala global. A política comercial mais restritiva por parte de grandes mercados importadores, a redução no consumo de vinho em determinadas regiões e o aumento das campanhas de saúde pública influenciam diretamente o comportamento dos consumidores.
Estes fatores, conjugados com as exigências crescentes da transição climática e digital, criam um ambiente competitivo mais complexo. O setor vitivinícola português, que nos últimos anos tem reforçado a sua reputação internacional, precisa agora de uma abordagem coordenada para manter e expandir os seus mercados.
A Proposta da ANCEVE: Diálogo e Planeamento
Neste enquadramento, a ANCEVE, no ano em que celebra meio século de existência, solicita uma reunião com a Comissão Parlamentar de Agricultura e Pescas, com o intuito de avaliar a situação atual e debater medidas que assegurem o escoamento da próxima vindima, promovam estabilidade nas relações comerciais e garantam apoio técnico e institucional adequado.
Esta reunião surge como uma oportunidade para reforçar a articulação entre setor público e privado, numa lógica de parceria que beneficie toda a fileira.
Caminhos para a Estabilidade
Apesar dos desafios recentes, o setor vitivinícola português continua a dispor de ativos de grande valor: diversidade de castas, regiões demarcadas de prestígio, conhecimento técnico acumulado e capacidade exportadora reconhecida. O momento atual é propício a uma reavaliação de prioridades, com o objetivo de construir um modelo de desenvolvimento mais robusto, equilibrado e preparado para novas exigências de mercado.
A antecipação e o planeamento são ferramentas essenciais. Ao abrir espaço para o diálogo, o setor poderá definir estratégias mais coesas, evitando assim tensões desnecessárias e promovendo uma cultura de estabilidade e colaboração.