Uma celebração vínica em Vila Nova de Foz Côa

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Entre os dias 23 e 25 de maio de 2025, Vila Nova de Foz Côa volta a acolher o Festival do Vinho do Douro Superior, evento que já vai na sua 12.ª edição e que se afirmou como um dos principais momentos de promoção dos vinhos desta sub-região duriense.

Criado com o objetivo de valorizar os vinhos do Douro Superior, o festival promove o contacto direto entre produtores e consumidores, com provas comentadas, concursos, colóquios e outras atividades dedicadas ao universo vitivinícola.

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A entrada é gratuita, mas para participar nas provas nos stands dos produtores é necessário adquirir o copo oficial do evento, por um valor simbólico de 2,5 euros.

Com esse copo, os visitantes podem provar livremente os vinhos disponíveis e conhecer melhor as características únicas da região.

copo foz coa festival vinho douro superior

O evento decorre em Vila Nova de Foz Côa, cidade que, para além da sua ligação crescente ao vinho, é também conhecida pela sua importância arqueológica e cultural.

O Museu do Côa, inaugurado em 2010, é uma das grandes referências da cidade, dedicado à arte rupestre do Vale do Côa — considerada Património Mundial pela UNESCO.

museum foz coa

Assim, visitar Foz Côa é também mergulhar na história milenar da região, onde natureza, património e vinho se cruzam de forma única.

Tive a oportunidade de visitar o festival no dia 24 de maio, e posso garantir que a experiência foi marcante.

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Desde a viagem — que serpenteia ao longo do rio e por entre montes cobertos de vinhas — até à chegada ao recinto do evento, tudo contribuiu para uma experiência sensorial e cultural.

Apesar de ser uma cidade de pequena dimensão, Vila Nova de Foz Côa surpreende pelo organização do festival, que decorre num amplo pavilhão com ambiente descontraído, boa disposição e muitas atividades paralelas: entrevistas, provas comentadas, demonstrações e momentos de convívio informal entre produtores e visitantes.

12 festival vinho douro superior prova comentada

Entre os vinhos provados, desde brancos frescos a tintos encorpados, passando por vinhos naturais também.

Moscatel do Douro: “É doce, mas sem ser enjoativo”

Entre os muitos vinhos em prova no Festival do Vinho do Douro Superior, um dos destaques foi o Moscatel do Douro, uma referência que, embora menos mediática do que o seu “primo” de Setúbal, revela uma identidade própria e um perfil muito apreciado.

festival vinho douro quinta do pacinho

Conversámos com um produtor da região, que nos explicou as características deste vinho singular.

– Que vinho é este que apresentaram aqui no festival?
“É um Moscatel 2006, já com algum envelhecimento. É um vinho intenso, com notas doces, mas sem ser enjoativo. Tem um toque de secura que ajuda a equilibrar o paladar. É um vinho de monocasta, feito exclusivamente com Moscatel do Douro.”

– Quais são as principais diferenças entre o Moscatel do Douro e o de Setúbal?
“O Moscatel do Douro é produzido, naturalmente, na região demarcada do Douro, com as especificidades do nosso terroir. Já o Moscatel de Setúbal, embora parta da mesma casta base, tem um estilo diferente. Na minha opinião, o de Setúbal é geralmente mais doce — talvez pelo clima, pela vinificação, ou mesmo pela tradição da região.”

– Considera que o Moscatel do Douro tem uma identidade própria?
“Sim, sem dúvida. O nosso moscatel tem uma doçura equilibrada, alguma secura que o distingue e uma acidez que ajuda a refrescar. É um perfil diferente do mais conhecido Moscatel de Setúbal, mas com um potencial muito interessante, sobretudo para quem gosta de vinhos doces mas bem balanceados.”

Este testemunho é mais uma prova da diversidade e riqueza do Douro Superior, onde mesmo vinhos fortificados, como o Moscatel, revelam nuances específicas da região. Uma boa alternativa para quem procura algo diferente, sem sair de Portugal.


Os produtores locais estavam bem representados, com dezenas de rótulos disponíveis, e os visitantes tinham também acesso a produtos típicos da região, como enchidos, queijos, azeites e doces tradicionais.

Uma surpresa gelada: gelado de vinho no Douro

Uma das descobertas mais inesperadas (e refrescantes!) deste festival foi o gelado de vinho — algo que provei pela primeira vez aqui e que me surpreendeu pela positiva. A criação é da empresa Segreti, desenvolvida pelo chef Antonio Vieira, com loja situada na Rua da Cruz, 852, em Lavra (Matosinhos).

festival vinho douro gelado do vinho segreti

O gelado não é excessivamente doce, tem uma textura suave e um sabor equilibrado, ideal para os dias quentes que se fazem sentir durante os eventos vínicos de verão.

Experimentei duas versões, mas confesso que o gelado de vinho tinto foi o que mais me conquistou — fresco, leve e cheio de carácter.

festival vinho douro gelado

Se tiverem oportunidade, recomendo mesmo que provem. É uma forma diferente e deliciosa de saborear o vinho fora do copo, e uma ideia criativa que combina perfeitamente com o espírito de inovação e prazer deste festival.

Conversa com o produtor do vinho Proibido: “Mais do que álcool, procuramos acidez”

Durante o Festival do Vinho do Douro Superior, tivemos oportunidade de conversar com o produtor do enigmático vinho Proibido, um dos nomes que mais chamou a atenção dos visitantes — tanto pela qualidade, como pela história por trás do rótulo.

festival vinho douro vinho proibido

– Como nasceu o nome “Proibido”?
“O nosso primeiro vinho foi o Proibido 2010, um Grande Reserva. E porquê Proibido? Porque comprámos as uvas a um senhor que, há muitos anos, viveu do contrabando junto à fronteira. Era um modo de sobrevivência durante a ditadura. O nome é uma homenagem a ele e a todos os que viveram dessa realidade. Assim nasceu o Proibido.”

– Estes vinhos são produzidos em altitude?
“Sim, totalmente. Trabalhamos com vinhas situadas a 600 e até 800 metros de altitude. Procuramos este perfil porque queremos vinhos com acidez marcada — para nós, a acidez é mais importante do que o grau alcoólico. Quem prova os nossos vinhos percebe logo essa frescura. É esse o nosso perfil.”

– E quanto às castas?
“Temos várias. Nos brancos, trabalhamos com rabigato e com uvas de vinhas centenárias, uma mistura tradicional de castas. Nos tintos, usamos castas como o marufo — que aqui no Douro também chamamos de maurisco, embora o nome legal seja marufo. É uma casta muito comum nas vinhas velhas.”

“Temos vinhos como o Acapella, que também resulta de uma mistura de castas antigas. O Déjà Vu, da colheita recente, tem touriga nacional, alvarilhão e tinta roriz de vinhas velhas. O Garrafeira é também um blend de vinhas velhas.”

– Que castas privilegiam?
“Gostamos muito de castas como o alvarilhão e tinta amarela. São variedades que nos permitem manter uma boa acidez, mesmo quando os vinhos têm 15% de álcool. Essa acidez dá-nos margem para trabalhar melhor e fazer vinhos com mais frescura e equilíbrio.”

– E nos brancos?
“Nos brancos também trabalhamos com viosinho, gouveio e arinto, castas que apreciamos muito. Temos mais trabalho nos tintos, é verdade, mas nos brancos também procuramos sempre esse equilíbrio entre frescura e estrutura.”

A filosofia da casa Proibido parece clara: vinhos autênticos, com identidade própria, onde o respeito pela tradição se alia à procura de frescura e complexidade. Um projeto que merece ser seguido de perto.


flower

Rostos conhecidos e reencontros vínicos

Outra vantagem destes festivais é a possibilidade de reencontrar muitas caras conhecidas do mundo do vinho. Vi por lá produtores que já conheço há algum tempo, como a Quinta da Vineadouro e a Valley Co., entre outros projetos interessantes.

E, para minha surpresa, também vi o @paulohenriquebento — sim, o mesmo dos vídeos curtos e inspiradores sobre vinho no Instagram, que costumo ver todas as semanas. Afinal, o vinho é também isso: encontros, partilhas e histórias.

O Festival do Vinho do Douro Superior é mais do que um evento vínico — é uma verdadeira celebração da identidade de uma região que alia tradição, inovação e património. Quem o visita, leva na memória não só os sabores dos vinhos, mas também as paisagens únicas do Douro, o calor humano dos seus habitantes e o peso da sua história.

O vinho Proibido nasceu em 2010 como homenagem a um antigo contrabandista da fronteira. Produzido com vinhas em altitude (600 a 800 metros), caracteriza-se pela frescura, acidez marcante e uso de castas como alvarilhão, marufo, touriga nacional e outras misturas de vinhas velhas.
O Moscatel do Douro 2006 apresentado no festival é um vinho doce, mas equilibrado por uma ligeira secura. Sendo uma monocasta, mostra um perfil distinto do Moscatel de Setúbal, com menor doçura e mais frescura, influenciado pelo terroir da região duriense.